Descobriu a paixão pelo têxtil aos 40 anos, pese embora ter revelado a sua criatividade desde jovem. Com uma licenciatura em Relações Internacionais e uma carreira de vinte anos no setor bancário, Diana Meneses Cunha decidiu escutar a sua voz interior em 2015, mergulhando num mundo próprio, após aprender a arte da tapeçaria. Desde então, desenvolveu uma linguagem e estilo únicos nas suas peças, distinguindo-se pela combinação de técnicas ancestrais, como tapeçaria em tear, macramé e bordado.
Como foi o seu percurso com os fios até chegar às grandes tapeçarias?
Acabou por ser uma exploração ao longo de várias fases e expressões, desde o ponto-cruz até aos arraiolos, passando pela bijuteria. Embora a minha abordagem fosse autodidata, a falta de continuidade marcava os meus projetos. Seguia esquemas, sem criar os meus desenhos. Quando vivia em Luanda, Angola, e trabalhava na banca, surgiu a necessidade de fazer algo mais e senti um impulso para criar. Creio que começou assim o meu gosto pelas tapeçarias.
Os seus trabalhos são arrojados e pouco convencionais.
Ao aprender e aplicar algumas técnicas, percebi que a minha tapeçaria não seguia a tradição portuguesa, tornando-se antes uma expressão decorativa contemporânea. Utilizava fios de diversas qualidades e espessuras, resultando em criações que me agradavam. Em Portugal, onde há uma rica tradição em tapeçaria e tecelagem, optei por explorar uma abordagem contemporânea e decorativa, capaz de ornamentar uma parede ou até mesmo simular uma que não exista.
Como aprendeu essas técnicas?
Naquela época, seguia a artista australiana Maryanne Moodie, então residente em Brooklyn, Nova Iorque. Numa brincadeira, mencionei ao meu marido o desejo de participar num workshop de tapeçaria. Ao explicar a minha intenção, ele organizou os voos e a estadia. Após concluir a primeira peça, percebi logo que tinha encontrado uma verdadeira paixão, mesmo sem compreender completamente o impacto que teria na minha vida.
Também faz tapeçaria em troncos, algo muito singular.
Foi uma ideia do visual merchandiser Raul Torcato para decorar uma montra. Pediu-me uma tapeçaria e, quando a peça estava quase terminada, sugeriu que fizesse algo com troncos de grandes dimensões. Aceitei, porque ainda em Angola apanhei um tronco na rua com dois ramos e fiz uma composição; esta foi a minha primeira tapeçaria, na verdade. Fiz então oito peças, com carta branca para criar o que quisesse. Os tons eram muito coloridos e a montra ficou incrível. Sempre fui criativa em tudo o que era trabalho com lãs e linhas, e um dia esta criatividade renasceu.
Conciliou a banca com a tapeçaria ou era só um hobby?
Apesar de adorar o meu trabalho no setor bancário, onde comecei com um estágio no quarto ano da faculdade, quando estava em Relações Internacionais, a tapeçaria passou a ser o meu refúgio criativo. Depois, comecei a criar peças para oferecer. Decidi então criar uma marca e um logótipo e comecei a partilhar fotografias desses trabalhos no Instagram. À medida que as pessoas mostravam interesse, percebia a necessidade de levar esta paixão a sério. Nesse tempo, as paredes da minha casa eram o meu portefólio.
A partir de determinado momento, começa a fazer muitos projetos…
Sim, desenvolvi mais de vinte cabeceiras de cama únicas, combinando macramé com tapeçaria, para diferentes apartamentos. Também fui contactada pelos proprietários do White Exclusive Suites & Villas, nos Açores, e concebi doze peças com efeito de divisórias, marcando o início deste tipo de trabalho. Recebi ainda um convite da Home Flavours, uma fábrica de têxteis de cama em Guimarães, para criar um stand com cerca de 50 m2 para a Heimtextil, a maior feira do mundo no setor, em Frankfurt, em 2017. Apesar de não ter uma ideia concreta para este projeto, aceitei o desafio e percebi que não podia continuar a trabalhar em casa.
Decidiu arrumar os fios e procurar um ateliê?
Era inevitável e tal coincidiu com o facto de a ceramista Anna Westerlund também precisar de um espaço. Assim, juntámo-nos e partilhámos um ateliê por três anos. Durante esse tempo, envolvi-me em projetos de grande dimensão, como a tapeçaria para o Bairro Alto Hotel, com oito metros de altura, que se destaca no hall das suítes. Por incrível que pareça, ainda conciliava o trabalho no banco com o ateliê, mas sentia que em breve teria de tomar uma decisão. Foi a vida que me obrigou a essa decisão, quando o meu filho mais velho, Afonso, faleceu, aos 16 anos, vítima de um acidente de mota, transformando completamente a nossa vida. O meu marido regressou de Luanda, deixou também a banca e tornou-se skipper de veleiros e faz passeios pelo rio Tejo. A partida do Afonso obrigou-nos, juntamente com os outros dois filhos, a abraçar a felicidade como forma de o honrar.
E nasce o ateliê onde hoje trabalha.
A marca Oficina 166 foi criada em 2016. Queria algo mais abrangente do que o ateliê, e o número é o da nossa antiga casa. Em 2021, mudei o ateliê para o Carrascal, em Sintra, e, um ano mais tarde, decidimos viver na mesma zona. É aqui que, além do meu trabalho, dou workshops e cursos onde ensino várias técnicas de tapeçaria ao mesmo tempo que organizo retiros criativos, como já fiz no Craveiral Farmhouse, em São Teotónio. Gosto de ensinar e não me preocupo se copiam ou não as minhas peças porque a criatividade não se copia; é algo singular a cada um.
Onde podemos ver os seus trabalhos?
Os que faço para instituições, hotéis ou espaços comerciais estão espalhados por Portugal e por outros países, e tenho outros expostos na loja do Museu de Arte Contemporânea, em Lisboa. Em breve, vou ter uma tapeçaria na Fundação do Gil, sendo que este tipo de trabalhos, e outros pensados para instituições como o Café Joyeux Portugal e a Associação Salvador, são pro bono. Para esta última peça, bordei uma fotografia da Frida Kahlo, técnica que também ensino nos workshops. Em 2023, aceitei um desafio tremendo da Câmara Municipal de Castelo Branco: juntar artes de três municípios, as tapeçarias de Portalegre, o bordado de Castelo Branco e burel da Covilhã, resultando numa instalação que apela à importância de preservar estas três formas de arte têxtil. Ao longo dos anos tenho tido sempre trabalhos incríveis, mas o processo criativo nem sempre é fácil, sou humana, tenho inseguranças e gosto sempre de partilhar estes sentimentos, porque sei que inspiro outras pessoas e é importante terem a consciência de que todos nós temos desafios.