É uma das mais talentosas e reconhecidas atrizes portuguesas. Em entrevista exclusiva à F Luxury, Maria João Bastos partilha insights sobre a sua carreira, projetos e visões pessoais. Com uma carreira multifacetada que abrange cinema, televisão e teatro, a atriz oferece uma perspetiva única sobre a indústria do entretenimento e o seu percurso artístico, revelando alguns dos seus momentos mais marcantes, entre eles aqueles relacionados com o Brasil, país que a abraçou e que ela traz no seu coração.
Quais foram as primeiras influências ou inspirações que despertaram o seu amor pela representação?
O meu pai gostava muito de cinema e tínhamos o hábito de ir juntos ao videoclube alugar filmes. Naturalmente, esse universo foi-me inspirando e fascinando cada vez mais. Eu sempre quis ser atriz, e nessa altura, tal como a maioria das famílias, também nós nos reuníamos para assistir às novelas brasileiras e, por isso, muitos desses atores eram grandes inspirações para mim. Quando era pequenina, imaginava-me a fazer novelas no Brasil com aqueles atores. Era um sonho que tinha e que acabou por se realizar.
Que principais desafios e momentos marcantes destacaria ao longo do seu percurso profissional?
São tantos! Lembro-me da minha primeira peça de teatro, quando tinha 12 anos, onde interpretava duas personagens completamente distintas. Com a primeira, fiz o público rir à gargalhada — era uma personagem muito engraçada — e, minutos depois, dava vida a outra, que declamava um poema e, de repente, vejo o público emocionado com lágrimas nos olhos. Nunca me esqueci dessa sensação e de como tinha tocado o público de forma tão intensa com aquelas duas personagens. Outro momento marcante foi a minha ida para a Globo, para gravar a minha primeira novela. Foi há 21 anos e naquela época era raro atores portugueses trabalharem na Globo, sobretudo numa novela do horário nobre. Eram outros tempos, era um mundo que fazia parte do meu imaginário, tão distante, mas de repente eu estava ali, para fazer parte daquele universo. Foi um enorme desafio e revelou-se uma sensação única. Mas há tantos outros momentos marcantes na minha carreira! Por exemplo, o filme Os Mistérios de Lisboa, que fiz com o diretor Raúl Ruiz, um marco muito importante para mim, profissional e pessoalmente.
Teve, desde cedo, a oportunidade de trabalhar fora do país. De que forma a experiência e o contacto com diferentes culturas influenciou o seu trabalho?
Comecei a viajar sozinha muito cedo: a primeira vez, fui viver para Brighton, com apenas 18 anos. Essa minha sede de conhecer o mundo e de mergulhar em novas culturas foi, e é, certamente, muito importante para a minha carreira e para aquilo que trago para cada personagem. Ter mundo é uma ferramenta fundamental para o nosso ofício. Ir trabalhar para o Brasil numa das maiores produtoras do mundo foi uma grande oportunidade de aprendizagem, de evolução. Cresci muito. Mas viajar é uma das minhas grandes paixões; já vivi em vários países, com culturas totalmente distintas, e tenho a certeza de que todas essas experiências me moldaram como pessoa e, claro, como atriz.
Que importância tem na sua vida, e no seu coração, o Brasil?
O Brasil é a minha segunda casa. Desde o primeiro momento que pisei o solo do Rio de Janeiro, tive uma forte sensação de pertença, como se já estivesse estado naquele lugar. E, ao fim dos 21 anos a dividir a minha vida entre Portugal e Brasil, é natural que já o considere também a minha casa. Tenho tido experiências incríveis a viver noutros países, desenvolvendo projetos internacionais, mas a sensação nesses lugares é a de que estou de passagem. No Brasil, sempre tive uma sensação diferente. A de estar em casa.
Foi a inspetora Paula Frias em Rabo de Peixe. Como foi dar vida a esta personagem e ver o trabalho nacional difundido pela Netflix?
Rabo de Peixe é um projeto muito importante para a nossa indústria; foi um momento marcante para a ficção portuguesa. Nunca um projeto português tinha chegado a tantos países e com tanto sucesso. Ficámos, obviamente, muito felizes, sobretudo porque ter uma produção portuguesa difundida no mundo inteiro abre portas para o mercado internacional, mostra o nosso trabalho, suscita curiosidade sobre o nosso mercado, sobre o nosso talento nas mais diversas áreas e traz mais oportunidades para o nosso país e para as nossas equipas. Rabo de Peixe é uma janela gigante para aquilo que se faz em Portugal e é, naturalmente, muito especial poder fazer parte disso.
Que outras atividades criativas ou projetos desenvolve fora do mundo do entretenimento?
Estou sempre a estudar qualquer coisa, quer esteja a trabalhar para um projeto ou não. Sou extremamente curiosa e a leitura, uma das minhas paixões, é o que mais estimula o meu imaginário. Mas também adoro cinema; ver filmes é algo que, do ponto de vista criativo, me preenche muito. Gosto de ouvir música — refiro-me, mesmo, a escutar, sentar-me e viajar com a música. E gosto de cantar, que é das atividades que mais me liberta.
Ultimamente, descobri a escrita e estou a desenvolver um projeto da minha autoria.
Existem atores, diretores ou outros profissionais com quem gostaria de trabalhar no futuro?
Sim, claro que sim. Existem vários diretores com quem ainda quero trabalhar. Ainda existe muito para fazer.
Como descreveria a relação da sua família com a sua carreira de atriz? Houve alguma resistência inicial ou apoio total?
A minha família não só foi o meu grande apoio em todos os momentos, como foram os grandes impulsionadores. As pessoas da minha família foram grandes impulsionadores. Quando era pequena, fazia teatrinhos com as minhas irmãs e apresentava-os à minha família, que assistia atentamente — e que os levava muito a sério (risos). Eles sempre me fizeram acreditar que, se esse era o meu sonho, então eu tinha as ferramentas necessárias para o realizar.
Como equilibra a sua carreira com a vida familiar? Existem desafios específicos que enfrente nesse aspeto?
Na verdade, é tudo muito natural. A minha carreira faz parte da minha vida e de quem sou e encaixa-se perfeitamente na minha vida familiar e pessoal. As pessoas que fazem parte da minha vida sabem que esta é a minha paixão e têm um enorme respeito pela minha dedicação. Claro que o facto de trabalhar fora de Portugal exige estar muito tempo longe delas e, apesar de ser difícil, acabamos por gerir bem a distância e temos sabido manter e preservar a nossa presença no dia a dia de cada um.
Como lida com a pressão e o escrutínio público, considerando o impacto que isso pode ter em si e nos que a rodeiam?
Sinto-me muito acarinhada pelo público. Felizmente, sempre senti respeito em relação ao meu trabalho e recebo bem as críticas, sejam elas positivas ou negativas, desde que construtivas. Aprendo com elas e vejo-as como algo positivo; faz parte! Contudo, procuro que o que não é construtivo ou que não se relacione com a minha vida profissional não tenha impacto em mim. Nunca expus a minha vida pessoal, esse sempre foi o meu posicionamento, porque essa é a minha natureza. E, assim, na verdade, sempre protegi a minha privacidade e a dos que fazem parte da minha vida.
Como vê o papel das mulheres na indústria cinematográfica e na vida artística em geral?
Vivemos um momento em que já se assiste a uma evolução nesse sentido, havendo uma maior participação feminina em vários campos. Também sabemos que existe um longo caminho a percorrer, mas é muito bom ver acontecer este movimento para um lugar de maior representatividade e igualdade de oportunidades para mulheres no sector do cinema e do audiovisual.
Na sua opinião, quais as mudanças mais significativas que ocorreram ao longo dos anos em termos de representação e oportunidades para as mulheres no cinema, teatro ou televisão?
As mudanças a que temos vindo a assistir são impulsionadas por várias mulheres que têm conseguido grandes conquistas, posicionando-se na indústria através do seu talento e, sem dúvida, da sua perseverança. Tem que ver com esse empoderamento, o dar voz, dar espaço e dar a conhecer o trabalho das mulheres. Ultimamente, Portugal tem visto acontecer iniciativas muito importantes nesse sentido, como é o caso da Academia Portuguesa de cinema com a Netflix, dando visibilidade ao trabalho de várias cineastas portuguesas, com a exibição dos seus filmes naquela plataforma, fazendo o seu trabalho chegar a mais pessoas, dando a conhecer os seus projetos e dessa forma criando mais oportunidades de trabalho.
Ainda há pouco tempo, a produtora Ukbar e a RTP criaram um projeto designado Contado por mulheres, em que todos os filmes foram criados e realizados por mulheres.
São fundamentais estas iniciativas e é preciso que aconteçam mais. Ainda há muito a fazer.
Que medidas acredita serem necessárias para promover a igualdade de oportunidades?
Continuar a criar essas iniciativas que investem no talento feminino e dar espaço a mais oportunidades para novos projetos, que incluam, cada vez mais, a participação das mulheres nas mais diversas áreas. Esse será um caminho pelo qual temos de lutar para colmatar as disparidades de género no sector.
É indiscutivelmente uma mulher bonita. Qual a sua relação com a beleza e que cuidados tem no seu dia a dia com a pele e o bem-estar físico de um modo geral?
O exercício físico é cada vez mais importante na minha vida e faço por manter um ritmo constante, assim como por ter uma alimentação saudável. Acredito no modelo de saúde integrativa, acredito numa abordagem com um olhar para o bem-estar como um todo, abordando a mente, o corpo e o espírito. Por isso, tenho todas essas preocupações como me alimento, como me exercito, com a qualidade do meu sono e com a forma como lido com o stress. Não adianta cuidar só por fora nem adianta cuidar só de um aspeto.
Com a minha pele, além de todos os cuidados diários, há dois passos fundamentais e que têm feito a diferença ao longo dos anos: nunca durmo maquilhada e nunca saio de casa sem protetor solar, faça sol ou chuva.
Quais são os seus segredos para manter uma aparência saudável e radiante apesar do stress e da falta de sono que tantas vezes acompanham a sua profissão?
Dormir bem, meditar, respirar bem e beber muita água. Em relação ao stress, as minhas escolhas diárias assentam muito em não permitir que controle o meu dia. Mantermo-nos calmos é um superpoder; a capacidade de não alimentar estímulos negativos nem pensamentos negativos ou levar tudo muito a peito mantém a nossa cabeça limpa e o nosso coração sereno. Procuro alimentar o meu pensamento com positividade, pois acredito que somos aquilo que pensamos.
Qual a importância de uma alimentação saudável na sua vida e carreira? Segue alguma dieta específica?
A alimentação é fundamental para uma boa performance na vida e na carreira e tento sempre pensar nisso quando faço as minhas escolhas. Leio muito sobre esse assunto, procuro informação, porque isso ajuda-me a fazer as escolhas certas. Quando me alimento bem, de uma forma consciente, sinto-me muito melhor física e psicologicamente e com muito mais capacidade para enfrentar um dia de trabalho. Quando estou com um ritmo muito intenso de trabalho é exatamente quando procuro ter mais disciplina e mais cuidado. É evidente que nem sempre encontramos as melhores opções nos ambientes profissionais, por isso a minha solução passa por cozinhar em casa e levar comigo a refeição para o local de trabalho. Aliás, procuro cada vez mais fazer as minhas refeições em casa.
Qual é a sua relação com a moda e em que baseia as suas escolhas a cada temporada?
Sempre gostei de moda, desde pequena, acho que em boa parte devido à relação direta que a moda sempre teve com o cinema, pela forma como me fascinava; nos filmes, os figurinos são como um veículo de comunicação não verbal e o que aquilo me contava das histórias e das personagens era algo que me fascinava. Depois, mais tarde, acabei por trabalhar como modelo durante seis anos e nasceu daí outra relação com esse universo, acabando por influenciar muitas das minhas referências. Mas, para mim, sempre foi uma forma de expressão e um reflexo da nossa essência e personalidade. As minhas escolhas refletem isso mesmo, o meu estilo e a minha estética. Gosto do minimalismo, gosto de cores neutras, peças intemporais, gosto de vestidos com cortes simples e elegantes.
Aliás, para mim, a simplicidade é sempre o mais elegante.
O que é hoje para si o maior luxo?
Tempo! Ter tempo para mim e para a minha família. Ter tempo para uma caminhada, para contemplar o mar, para meditar no meio do dia, para dormir, para fazer uma refeição devagar. Já não me permito viver em stress; a minha serenidade vale ouro e eu dou-lhe cada vez mais valor.
Que sonhos tem por realizar e que gostaria de ver concretizados num futuro breve?
Tenho tantas coisas que quero realizar, tantas personagens que quero interpretar, tantas pessoas com quem quero trabalhar! Tenho sede de conhecimento, quero aprender cada vez mais e praticar esse conhecimento para poder absorvê-lo. Quero ter sempre o foco na minha evolução como pessoa e profissional e sentir-me realizada com o presente, fascinada com o inesperado e entusiasmada com o futuro. E preservar a capacidade de sonhar.
Que palavras de alento e motivação gostaria de deixar a todos os leitores da
F Luxury que procuram seguir a carreira da representação?
Sonhem, imaginem-se a fazer aquilo que desejam, corram atrás e nunca desistam. Se essa é mesmo a vossa paixão, não tenham medo de arriscar.