Nos projetos assinados por Marta Mantero existe uma atmosfera que eleva ainda mais o diálogo com a envolvente. Com um estilo eclético e descontraído, a designer de interiores faz fluir os espaços com leveza e equilíbrio. A sua capacidade de criar e reinventar ambientes está na essência das pessoas que vão habitar as casas, onde as peças de mobiliário e decorativas comunicam entre si sem perturbar a quietude dos lugares.
O que mais a influenciou quando iniciou o percurso como designer de interiores?
Apesar de ter estudado Design de Interiores, durante muito tempo apenas tive lojas —embora colaborasse com arquitetos e designers de interiores, mandando fazer e fornecendo peças oriundas de Marrocos e, mais tarde, da Índia. Comecei a importar peças de Marrocos no início dos anos 1990, quando era uma novidade, e este país foi, sem dúvida, uma grande influência para mim. Sem esquecer a minha mãe, que tem um grande sentido estético e sempre teve muita atenção à decoração das suas casas.
Pouco tempo depois de abrir a loja em Grândola apostou na Comporta, mantendo-se fiel ao conceito.
Comecei a passar mais tempo em Grândola, onde abri uma loja, já que nessa época começava a haver cada vez mais casas de férias na região, razão por que me aventurei a fazer os primeiros projetos de decoração a pedido de clientes e amigos. A loja na Comporta surgiu de forma casual através de um amigo, o artista britânico Jason Martin, que alugou um armazém para o seu ateliê e sugeriu que eu tivesse uma loja num espaço independente que existia nesse armazém. No início, a Rice abria apenas no verão, mas, em 2016, passou para o centro da vila e hoje está aberta o ano todo.
O que é para si mais importante quando idealiza um projeto de decoração?
Ao conceber um projeto, é essencial o diálogo que estabeleço com os clientes, com quem trabalho lado a lado, para poder dar forma ao que pretendem para a sua casa. A empatia desempenha um papel crucial neste processo e é muito importante que me identifique com a visão do cliente, já que estabelecemos uma relação duradoura e intimista. Ao longo da minha carreira, tive a sorte de me identificar com a maioria dos clientes com os quais trabalhei, muitos dos quais são hoje meus amigos.
Há algum estilo que possamos identificar como tendo a sua assinatura?
Mais do que um estilo, tenho um gosto transversal a vários estilos. O fio condutor nos meus trabalhos é o meu gosto e não um estilo. Gosto de misturar de forma intuitiva. Não sigo fórmulas; cada projeto é diferente, tal como cada cliente é diferente. Estou a acabar um projeto no sul de França que dura há três anos. Fica em Gordes, um lugar muito bonito no Luberon. Sinto-me privilegiada por ter a oportunidade de fazer este projeto único, que é um grande desafio, muito diferente do que faço habitualmente. O meu trabalho é uma extensão de quem eu sou e mantenho uma equipa pequena para garantir que cada projeto recebe a minha atenção pessoal. O vínculo com o cliente é fundamental, e é por isso que todos os aspetos criativos passam por mim, o que acaba por limitar o número de projetos que posso aceitar. Não tenho planos de crescimento, porque acredito que iria comprometer a intimidade e a qualidade do meu trabalho, o que é essencial para mim.
Como equilibra a estética com a funcionalidade ao projetar um espaço?
O equilíbrio entre estética e funcionalidade é uma grande preocupação no meu trabalho, que é dividido em duas partes: consultoria à arquitetura, começando a trabalhar com os arquitetos numa fase inicial do projeto — muitas vezes fazendo a ponte entre cliente e arquiteto —, e design de interiores. A minha abordagem é guiada pelas necessidades do cliente, é preciso ouvir e interpretar as suas intenções, conhecer o seu modo de vida, pelo que cada projeto é único e reflete a singularidade de cada cliente.
Ainda faz recuperação de casas ou cabanas?
É algo que faço cada vez menos já que a tendência na região é, exponencialmente, a construção de casas novas, algumas inspiradas na arquitetura local, mas com mais espaço e conforto. Como resultado, a maioria dos meus projetos começa, hoje em dia, do zero. Acredito que a decoração deve estar em harmonia com a arquitetura e tem sido muito enriquecedor trabalhar com arquitetos de grande talento que muito me têm ensinado. Tenho feito alguns projetos mais contemporâneos que fogem ao estilo típico da Comporta, já que os desafios evoluíram ao longo do tempo, mas essa evolução acaba por ser gratificante.
Tem algum projeto de referência ou um desafio que queira dar a conhecer?
Acho que o projeto que se destaca como maior desafio é a casa no sul de França! Tem sido uma experiência única e um privilégio trabalhar no projeto de uma casa histórica, o que foi um desvio significativo dos meus projetos habituais. Embora tenha recebido pedidos para fazer mais casas fora de Portugal, o meu objetivo não é expandir em logística ou equipa, prefiro projetos mais perto de casa, o que me permite dedicar tempo a outras áreas, além da decoração.
Além da decoração, há outros projetos que abrace atualmente?
Estou envolvida num setor diferente, embora também tenha um lado criativo. Sou sócia da Pego da Moura, uma empresa produtora de vinhos, com vinhas em Grândola e Melides, ao lado de Manuel Ricciardi e Jason Martin. Um dos nossos vinhos, o Alfaiate, é considerado um dos melhores brancos da região. Lançámos recentemente outro vinho, o Caveira, assim batizado em homenagem à aldeia onde parte das vinhas estão plantadas. O vinho também é uma arte e o facto de termos o Jason como sócio dá uma vertente ainda mais artística à empresa, tendo sido ele a desenhar os rótulos do Caveira assim como a edição limitada de 250 magnums com caixas pintadas por ele.
As viagens foram marcantes para se inspirar. Que influências se manifestam no seu trabalho?
Encontro inspiração em todo o lado, basta estar atenta e aberta ao que me rodeia. Conheci a região da Comporta pela mão de Pedro Espírito Santo, no final dos anos 1980, e foi uma grande inspiração para mim! Tento manter viva a herança da região através dos detalhes, mesmo que integrados em interiores mais minimalistas.
Os arquitetos e os clientes também contribuem para as minhas inspirações, abrindo-me novas portas, novas formas de olhar; os lugares aonde vou, as pessoas com quem troco ideias, tudo isso faz parte do processo criativo. Sem nunca esquecer as viagens.
O seu trabalho é muito divulgado na imprensa internacional. O que representa para si este reconhecimento?
Sinto um enorme orgulho! Nunca imaginei ter um projeto meu na capa da Côtè Sud! Tenho a sorte de ter produtoras e fotógrafos que gostam do meu trabalho, com quem partilho novos projetos e é raro um projeto que não queiram fotografar. Estamos à espera da primavera para fotografar o projeto no sul de França e outro perto de Melides. É muito gratificante ver o meu trabalho através da lente de grandes fotógrafos, vê-lo ser reconhecido e divulgado na imprensa internacional, nas revistas que eu comprava, no passado, sem pensar que um dia estariam projetos meus nas suas páginas.
Em termos de futuro, o que podemos esperar das suas criações?
Vai depender muito dos projetos que surgirem. Mas sinto que as pessoas querem passar mais tempo em casa, privilegiando o conforto, a serenidade e o convívio com a família e amigos, o que também é muito importante para mim.