Tom Ford é um homem que sabe o seu valor e não pede desculpa por isso. Existe uma relação disfuncional com o valor que deve ser dado ao ser humano. Uma coisa é arrogância; outra é saber exatamente aquilo de que se é capaz. A primeira tem um preço; o segundo tem valor.
Já Oscar Wilde dizia que “cínico é aquele que sabe o preço de tudo e o valor de nada”. E dar valor à arte e à cultura é algo que temos de reaprender a fazer, pois corremos o perigo de pagar um preço demasiado alto. Tom Ford não só sabe o seu valor, como reconhece o dos outros. Não é por acaso que o seu dom artístico se estendeu da moda ao cinema. A sua estreia na realização foi sublime. Um Homem Singular (A Single Man, no original) expira elegância no guarda-roupa, nos cenários, em cada plano e, claro, nos atores Julianne Moore e Colin Firth. Poder-se-ia pensar que Ford apenas quereria treinar os seus dons artísticos no grande ecrã, mas a verdade é que se apaixonou pela sétima arte e regressou à realização em grande forma com Animais Noturnos (Nocturnal Animals, no original), um filme bem diferente da sua estreia, com um lado bem mais negro da natureza humana.
Thomas Carlyle Ford nasceu a 27 de agosto de 1961, em Austin, no Texas. Tanto o pai como a sua mãe – Tom Ford, Sr. e Shirley Bunton – eram ambos agentes imobiliários e, por isso, o estilista passou grande parte da sua infância no rancho dos avós, em Brownwood. Um dos seus passatempos preferidos nessa altura era ficar deitado junto à piscina dos avós, e cedo começou a interessar-se por arte como, por exemplo, a pintura. Ford recorda essas memórias como sendo um artista da imagem – “sempre fui muito visual, sempre me interessei por design. Isso não quer dizer que tenha começado a desenhar roupa aos 5 anos de idade, mas, se os meus pais fossem jantar fora, eu passava o serão a reorganizar toda a mobília da sala antes do regresso deles a casa”. Os pais de Ford tiveram grande influência no crescimento do seu gosto por todas as artes. Se ele quisesse pintar, eles seriam os primeiros a ir à procura de um professor de pintura para ensinar o filho.
As suas grandes musas para o mundo da moda foram inicialmente a mãe e a avó. Ford recorda a mãe como uma mulher de uma elegância extremamente clássica, enquanto a sua avó paterna se destacava pelo glamour à la Texas, tudo em grande e chamativo, fosse em joias ou em carros. Seriam precisamente estes dois estilos, da mãe e da avó, que Ford iria combinar, mais tarde, para reinventar e salvar a marca Gucci da falência em meados dos anos 90.
Aos 17 anos, Ford terminou o liceu e matriculou-se na NYU (Universidade de Nova Iorque), em 1979, no curso de História de Arte. Enquanto estava na universidade, descobriu o famoso Studio 54, do qual se tornou cliente assíduo e deixou os estudos para segundo plano. Após um ano, desistiu da universidade e mudou-se para Los Angeles, onde fez alguns trabalhos como ator. Foi esse dinheiro que foi ganhando que mais tarde tornaria possível inscrever-se na Parsons School of Design, onde começou por estudar Arquitetura, mas rapidamente percebeu que não estava no caminho certo. Assim, muda o seu curso para Moda e vai estudar para o campus universitário da Parsons School of Design em Paris.
Assim que terminou o curso em 1985, Ford procurou emprego junto de Cathy Harwick, uma designer de roupas desportivas. Para conseguir o trabalho, Ford ligou todos os dias para o escritório de Hardwick durante um mês seguido. Foi esta persistência que fez dele a marca que conhecemos hoje. Na altura Hardwick estava convencida que não lhe ia dar esperanças, mas, depois de perguntar quais eram os seus designers europeus favoritos, ficou convencida e decidiu empregar Ford. Armani e Chanel foi a resposta que deu. Meses mais tarde e por curiosidade, Hardwick perguntou a Ford porque é que ele referiu o estilista Armani, ao que ele respondeu “porque estavas a usar uma peça Armani”. Este espírito de sobrevivência seria a salvação da Gucci.
Tom Ford chega à marca italiana em 1994, e a Gucci mudaria para sempre. Com a sua rebeldia e irreverência, conquistou um mercado que parecia perdido para sempre. Renovou por completo a imagem antiquada da marca, substituindo o minimalismo por uma atualização de looks retro que respiravam sex appeal. Além disso, Ford expandiu a área de negócio da Gucci para a roupa desportiva, masculina e feminina, roupa de cerimónia e decoração para casa. Ainda sob a liderança de Ford, a Gucci fez o negócio que iria alimentar um crescimento notável, ao comprar a prestigiada Yves Saint Laurent. Com a marca francesa a fazer parte do grupo Gucci e a liderança de Ford, as vendas anuais da empresa aumentaram exponencialmente de 230 milhões de dólares para 3 mil milhões de dólares. Ainda com o toque de Midas de Ford, a casa Gucci passaria a incluir também as marcas Sergio Rossi, Bottega Veneta e Balenciaga. Mas a compra da Gucci pelo grupo Pinault em 2004 ditaria a saída do seu menino-prodígio. Em 2005, o estilista lança a sua própria marca – Tom Ford –, apresentando uma coleção de moda masculina, óculos e produtos de beleza. A marca Tom Ford teve uma visibilidade praticamente imediata no mercado, quando o próprio Ford posou para a edição de 2006 da Vanity Fair vestido com roupas da sua marca e com as atrizes Keira Knightley e Scarlett Johansson nuas a seu lado.
Tom Ford está constantemente a reinventar-se e é precisamente essa capacidade que o torna um dos nomes gigantes da moda internacional.
“Acho que sou hiperconsciente de que as pessoas pensem que sou egoísta, mas há uma diferença entre ser egoísta e saber o próprio valor como produto e como ator. Eu sei o meu valor como produto, e divorciei-me como ser humano de mim próprio como produto.” – Tom Ford
Por Ana Cristina Valente