
Licenciada em Comunicação Empresarial e com mestrado em Gestão do Luxo, da Moda e da Arte pela Universidade Sorbonne, Mónica Seabra-Mendes é uma das maiores especialistas no segmento de luxo em Portugal. É também diretora do Programa Executivo de Gestão do Luxo da Católica Lisbon Business & Economics e sócia-fundadora da Affluencial, plataforma destinada à consultoria e formação no segmento da gestão do luxo. Trabalhou com as maiores marcas de luxo e será a oradora convidada no encontro de 8 de março do F Club.
Quais são as principais características do mercado de luxo em Portugal?
É um mercado pequeno, mas em crescimento e com maior capacidade de atrair marcas com relevância internacional; a abertura da Dior em Lisboa é disso exemplo. Porém ainda oferece poucas alternativas de retalho de luxo, não criando oportunidades para mais marcas nem para a instalação de marcas portuguesas de excelência. Temos uma Avenida da Liberdade com carências e não temos outra alternativa. No Porto, a zona dos Aliados está a crescer para o luxo, mas faz-nos falta, em geral, um bom conceito de department store, tão propício ao desenvolvimento de marcas de luxo e tão presente nas grandes capitais de luxo europeias e no mercado americano.
Se falarmos na procura, o que podemos saber?
Do lado da procura, é um mercado com cada vez mais portugueses e residentes estrangeiros, mas ainda com uma maioria de turistas, como acontece em Paris, Milão ou Londres. Mas a procura também se diversificou, trazendo novas nacionalidades, como a chinesa e a americana a juntar às tradicionais geografias de afeto, como a brasileira e a angolana. A procura não se esgota nos produtos das marcas internacionais e há um interesse crescente por produtos portugueses de excelência, como os bordados, o mobiliário, o artesanato, porcelanas, vinhos e outros, bem como na área do imobiliário e do turismo de luxo, hotelaria, experiências e gastronomia, setores com crescente expressão no segmento do luxo em Portugal.
Há novos mercados de luxo e outros setores a surgir?
Há mercados que, pelo grande número de potenciais consumidores ou pela sua apetência e crescente poder de compra para o luxo, são apontados como os mercados do futuro, caso da India, África e América Latina. Contudo, há muito que estes mercados são emergentes, mas, por razões políticas, sociais ou económicas, acabam por nunca se traduzir em mercados consistentes. O Brasil é exemplo de um país que, na primeira década do novo milénio, trouxe muita expetativa e atraiu muito investimento para o luxo, mas acabou por não corresponder. A Ásia e os EUA vão assim continuar a ser os motores do luxo mundial. Quanto a setores de atividade que têm vindo a ter mais relevância para o luxo, um deles é sem dúvida o mercado do Longevity, Health & Wellness. Para quem tem acesso a tudo, ter mais tempo e melhor tempo de vida é o luxo supremo.
As marcas de luxo fazem uma boa comunicação ou há ainda algo a fazer?
É uma questão que se presta a várias reflexões. Para não me alongar, refiro apenas que as marcas de luxo têm feito um esforço para comunicar com as novas gerações, utilizando uma linguagem cativante, sem alienar os clientes mais tradicionais, que também exigem rever-se na marca. Para as marcas em geral, é um desafio, mas, para as do luxo, é ainda mais exigente este equilíbrio. Creio que nunca como hoje se têm visto tantas “tentativas e erros” comunicacionais e de posicionamento nas marcas de luxo para responder a diferentes expectativas e solicitações. A última colaboração da Nike x Tiffany é um exemplo concreto de uma certa demonstração de “navegação à vista”.
Podemos considerar Portugal um luxo?
Portugal tem fatores e valores endógenos extraordinários que podem ajudá-lo a redefinir o luxo do futuro, não me canso de dizer. A localização privilegiada, a gastronomia, a autenticidade, a qualidade do saber fazer, a cultura, a segurança e o respeito pela privacidade. Por isso temos atraído uma elite internacional que se identifica com estas características em alternativa a outros destinos de luxo e de um luxo mais mundano. Há, contudo, uma diferença substancial entre “Portugal ser um luxo” e ser um “destino de luxo”. Ainda há muito a elevar em termos de infraestruturas, ordenamento urbano, paisagismo, serviço e, em última instância, em posicionamento e comunicação para que o nosso país, não perdendo nunca a sua identidade, crie mais valor e continue a atrair todos aqueles que são capazes de nos respeitar e apreciar, pagando um valor justo.
Como é viver entre o luxo e o que sente pelo seu trabalho?
O meu trabalho é um prazer, não por trabalhar na área do luxo, mas porque faço o que gosto e tenho o privilégio de contactar a diário com marcas, empresas, projetos e pessoas em setores criativos, muitos deles associados a heranças culturais e de saber-fazer impressionantes. Lido com profissionais comprometidos com a excelência e com muita energia para fazer cada vez mais e melhor. Há muitas empresas/marcas a reposicionarem-se ou a fortalecerem a sua posição na área do luxo em Portugal, e ser testemunha ativa deste processo é gratificante. Aliás, uma das maiores gratificações da minha carreira foi a de ter contribuído para pôr o tema da gestão do luxo na ordem do dia. Hoje, as marcas portuguesas não têm pudor em assumir este posicionamento e estão abertas a aprender. O programa de Gestão de Luxo da Católica Lisbon Business & Economics que dirijo tem tido uma procura sem precedentes.
O seu percurso profissional deu-lhe um empurrão para este setor ou foi um acaso?
Nunca pensei trabalhar na área do luxo, mas sempre me interessei pela excelência, pela estética e sempre apreciei a beleza, a arte. Acabou por ser um processo natural, mas muito impulsionado por professores, colegas e amigos e, mais tarde, por pares e profissionais que sempre me incentivaram e convidaram a seguir este caminho. Sempre que existia uma oportunidade neste sector, pensavam em mim. Parecia ser sempre o perfil certo. A minha carreira acabou por se fazer sempre em marcas de luxo, o que depois me levou a considerar uma especialização e a decidir partilhar os meus conhecimentos sob a forma de formação e de consultoria.